De cada R$ 100 do orçamento das famílias brasileiras, sobram apenas R$ 41,22 para consumir, pagar dívidas e investir, aponta levantamento da consultoria Tendências. Renda tem sido pressionada pela alta dos preços de alimentos, energia elétrica e combustíveis.
Pelo país, não faltam exemplos de brasileiros que estão com dificuldade para fechar a conta todo mês. Neste ano, de cada R$ 100 do orçamento das famílias brasileiras, sobram apenas R$ 41,22 para consumir, pagar dívidas e investir, mostra um levantamento da consultoria Tendências.
Isso significa que a maior parte da renda vai para itens considerados essenciais – como combustível, energia elétrica, transporte, entre outros. As famílias não tinham uma situação financeira tão apertada desde 2005, quando a renda disponível era de apenas R$ 40,98.
O orçamento dos brasileiros tem sido pressionado por uma combinação bastante perversa: uma alta dos preços dos alimentos, que se arrasta desde o ano passado, e um aumento do valor dos combustíveis e da energia elétrica.
Em detalhe, os números pesquisados mostram que a situação é ainda mais dramática para os brasileiros das classes D e E, que ganham até R$ 2,6 mil por mês e sofrem mais com o aumento dos preços. Para esse grupo, sobram apenas R$ 21,63 por mês.
"Não tem escapatória. As classes mais baixas não têm como se defender muito nesse momento. A gente está com um nível de desemprego recorde no Brasil", diz Marco Maciel, sócio e economista da Kairós, empresa de gestão de fundos de investimento no Brasil. "O desemprego afetando milhões de brasileiros tende a fazer com que a capacidade de reagir ao aumento da inflação seja muito limitada."
Em 12 meses encerrados em junho, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) já acumula alta de 8,3%. Só a inflação de itens considerados essenciais chegou a 10,5%, segundo a Tendências. Diante de todo esse quadro, os analistas têm piorado as projeções para a inflação de 2021.
No relatório Focus, do Banco Central, os analistas consultados já projetam que o IPCA vai encerrar o ano em 6,56%, acima, portanto, do teto da meta do governo, que é de 5,25%.
"No momento, a minha projeção para o IPCA no fim do ano é de 6,5%, mas, em função das pressões de tarifas de energia elétrica, combustíveis e alimentação no domicílio, essa inflação pode pular para 7,2% com facilidade", diz Maciel.
Na próxima semana, o Comitê de Política Monetária (Copom) se reúne para decidir o rumo da taxa básica de juros (Selic). Os analistas esperam um aumento 1 ponto percentual, levando a Selic para 5,25% ao ano.
Juros mais altos encarecem o custo do crédito, afetando a tomada de recursos para o investimento das empresas e para o consumo das famílias.
«Ao elevar os juros, o Banco Central acaba encarecendo o custo para todos, não só para pessoa física, mas para a jurídica também", diz o economista da Kairós. "Infelizmente, a política monetária, num momento como esse, não tem como ser vertical, acaba sendo horizontal, atinge a todos do mesmo jeito. Quem se defende melhor é quem tem o bolso mais cheio."
A alta da inflação e dos juros e a limitação do orçamento das famílias podem mitigar a velocidade de recuperação esperada para o varejo e, consequentemente, da atividade econômica.
Com a melhora da crise sanitária, os analistas seguem esperando uma retomada do setor neste ano, mas esse crescimento poderia ser melhor se as famílias tivessem algum fôlego no orçamento - até maio, as vendas do varejo acumulavam alta de 6,8% no ano, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
*Publicado originalmente como editorial na edição 50 da Revista Painel Alagoas
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