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24/05/2022 às 09h00

Geral

Flori, Signo de Vida

Felipe Camelo

Por Felipe Camelo

Confesso que, desde crian­ça, vivo em constante liga­ção com o Meio Ambiente, incluindo fau­na e flora. A vida me levou pra mui­tas cidades mundo afora mas meus momentos aqui na terra de minha família materna sempre foram os + marcantes e consequentemente inesquecíveis.

Principalmente pelo contacto com animais soltos, vivendo livres. Como umas enormes tartarugas, e os peixes-boi, que provocavam alvo­roço quando apareciam, princi­palmente por serem mamíferos aquá­ticos. Crianças, não entendíamos e isso nos encantava ainda +.

Enormes e dóceis, com muita car­ne e gordura, até sua pele era cobiçada, e utilizada em inúmeros produtos, principalmente no período do Brasil colonial, quando se iniciou a caça desordenada, predatória, já que eles são facilmente capturados e não demorou a espécie ser tris­temente 1 das + ameaçados de ex­tinção no Brasil.

Assim, em 2009, reunindo os Mi­­nistérios Públicos Federal e Es­ta­dual, as prefeituras de Porto de Pe­dras e São Miguel dos Milagres, a APA (Área de Proteção Ambiental) Costa dos Corais, o Centro de Mamí­feros Aquá­ticos e algumas unidades do Insti­tuto Chico Mendes de Con­servação da Biodiversidade, foi cria­da a Associação Peixe-boi, para pre­servar a espécie. Foi a  “luz no túnel”.

Especificamente aqui no rio Ta­tua­munha, onde inúmeras nascentes d’água doce alimentam o rio oferecendo abundância do precioso líquido, garantindo o perfeito ha­bitat, tanto que foi montado incrível estrutura que proporciona o maior conforto, mantendo todas as ca­racterísticas de ambiente natural, com nativa vegetação de mangue, garantindo segurança, principalmente, já que alguns não sobreviveriam soltos na natureza. Outros, passam por período de adaptação, para serem posteriormente libertos mas devidamente monitorados por equipamentos de alta tecnologia.

Desde então, venho acompanhan­do o incansável trabalho da As­sociação presidida por Flávia Rêgo, portopedrense que, desde pequena, sempre foi encantada pelos peixes-boi e já sabia que dedicaria a vida na defesa destes animais que chegam aos 500 kgs, herbívoros, que pre­ci­sam por as narinas para fora d’água para respirar. Mesmo vivendo tam­bém em água salgada ou salobra, se hidratam com litros e litros de água doce.

Por estas características dife­rentes de todas as outras espécies aquáticas, chamou atenção de Flávia, que se graduou em Biologia e não se vê n’outra função que não seja preservar a natureza, especialmente os animais que nadam,  ma­mam quando bebês e se alimentam de plantas quando adultos. Nos cer­cados, cordas de alface e rúcula não faltam, já que eles comem, em mé­dia diária, 10% de seu peso. Esta pai­xão de Flávia envolve toda a sua família, inclusive marido, filhos, além de amigos, todos acabaram assumindo também esta luta.

Diversos fatores agravam os riscos que estes especiais animais enfrentam, como a absurda polui­ção das águas, como o incredível des­­carte de lixo, tanto que a Asso­ciação está sempre envolvida em ações de limpeza de praias e rios. O que alivia é que a caça foi proibida por lei federal, mas mesmo assim, eles seguem ameaçados de extinção.

1 das preocupações da Asso­cia­ção quando foi criada era ordenar o turismo de observação, envolvendo as pessoas da comunidade, com­par­tilhando com elas o compromisso e a preocupação em defender a espécie.

Tanto que muitos dos associados eram pescadores, abraçaram a causa e até hoje transportam cu­riosos turistas, que chegam com mui­ta vontade de saber + e ver o + per­to possível como eles vivem no san­tuário. Apenas 70 por dia, que se comprometem e prometem silêncio durante o passeio, para não perturbar o sossego dos fofos habitantes dos cercados. Como o casal carioca Luiz Alberto & Rosária Dias, e os ca­pixabas Patrícia & Reinaldo Batista, que se confessaram encantados com tudo, principalmente com os cuida­dos que os animais recebem dos mem­bros da Associação, como os guias que dominam o tema e com­partilham precisas informações. An­ge­lina, por exemplo, que destaca a importância da coletiva conscientização sobre a preservação ambiental. 

Atualmente a Associação agre­ga 43 integrantes, das + variadas formações, incluindo analfabetos com conhecimento empírico, nato, que dominam a prática da pesca e sabem tudo de maré, mangue, rio, peixes, sol, lua… até acadêmicos gra­duados com títulos e vasto conhecimento técnico, cujos saberes se complementam, formando verdadeira cadeia de informações, que garantem total domínio no trato com os animais, mas o + incrível, são eles, os peixes-boi, quem ditam as regras, já que, por + sapiência e sabedoria que a equipe tenha, são os mamíferos aquáticos quem ditam as regras. São irracionais, mas surpreendentemente sensíveis e intuitivos. Se comunicam por gritos, e comprovadamente, 1 mãe reconhece seu filhote pelo timbre, pelo tom de seu som. É lindo d+.

E por falar nisso, turbilhão de emoções e sentimentos, reboliço emocional desde que detectaram que Paty estava grávida, depois de algumas cópulas com Raimundo, que já havia sido solto mas, por motivos diversos, acabou de volta ao Tatuamunha.

Aos 8 anos, Paty seria liberta, pronta pra encarar a vida, mas, poucos dias antes da soltura, a sur­preendente notícia impediu que ela fosse nadar livre. 1 ano e 1 mês de­pois, a luz chegou ao cercado que a prefeitura de Porto de Pedras pre­parou especialmente para a chegada de nova geração, com fecundação e nascimento em cativeiro, fato pla­netário, inédito e fortemente cele­brado. Votação popular e Flori foi “ba­ti­zada” homenageando dona Flori, 1 das Mestras da Cultura Popular de Alagoas e nativa da região.

Mas, qual surpresa a vida pre­parou, com o trágico e impensável acidente. Mesmo com todos os en­sinamentos que Paty passou pra fi­lha nos 1ºs dias (como mostra a imagem de Paty nadando com Flori no topo do corpo) não impediram que a pequena (sic!) se enganchasse nas raízes do mangue e não con­seguisse subir pra respirar. No mes­mo grau do mundialmente inédito nascimento pleno de felicidade, o pre­­maturíssimo falecimento se trans­for­mou, com vetores invertidos, e profunda tris­teza se abateu em todos os que já ama­vam Flori, e puderam conviver com ela, mes­mo que por tão poucos dias. Pouquíssimos.

Mas, em respeito à sábia Na­tureza, entendimento e consciência da importância da vinda e vida de Flori, que mesmo breve, foi intensa, tornando-a eterna, inesquecível Flori. Está n’outra dimensão e Paty segue abatida, claro, mas muito bem assistida, monitorada e dengada.

Assim, esta coluna é sensivelmen­te de­dicada ao amor ao Meio Am­biente e à Vida, inclusive animal, já que todos preci­samos de todos os seres vivos, e da Na­tureza como 1 todo, para viver. Com certe­za, a con­cepção, a gestação, o nascimento e a morte de Flori não foram em vão. O sen­timento geral dos bravos e hu­ma­nos asso­cia­dos é de total espe­rança e felicidade, certos de que é sim pos­sível tirar os peixe-boi da ex­tinção, do extermínio. Outros nascerão ali.

Afinal, para sobrevivermos, pre­cisamos a natureza intacta, pre­ser­va­da, plena de si, para que nós hu­ma­nos, sobrevivamos, dignificando e honrando a literal denominação que nos classifica Humanos. Façamos por merecer.

E viva Flori!!!


Fonte: Painel Alagoas

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