Renata Bertolino*
Identidade, raízes, ancestralidade, originalidade são características comuns a um afroempreendedor. Atualmente, o mercado voltado a produtos e serviços ligados à cultura africana tem crescido no Brasil e vem ocupando espaços em Alagoas. A capital alagoana, por exemplo, tem visto um crescente movimento de afroempreendedores que buscam construir seus próprios negócios e contribuir para a economia local.
De acordo com o Mapeamento de Afroempreendedores 2024, realizado pela Secretaria de Estado da Mulher e dos Direitos Humanos (Semudh), em Maceió e região metropolitana, os principais negócios dessa região estão concentrados na arte e cultura (32%), moda (23%) e alimentação (12%).
De acordo com Jonathan Silva, gerente de Execução e Monitoramento de Políticas Públicas para Igualdade Racial da Semudh, a pesquisa representou um avanço significativo para a inclusão econômica e social da população negra e apresentou as barreiras impostas por este mercado.
"O levantamento destaca, por exemplo, que os afroempreendedores enfrentam desafios específicos, como dificuldades no acesso a crédito e capacitação profissional, além de barreiras associadas à formalização de seus negócios e discriminação racial. Contudo, essas barreiras têm sido gradualmente enfrentadas por meio de ações de apoio e sensibilização da sociedade para a importância do afroempreendedorismo, incentivando o desenvolvimento de redes de contato, acesso a recursos e capacitações específicas", avaliou Jonathan.
Nesse cenário, mulheres negras desempenham um papel fundamental. E em Alagoas elas são protagonistas desse movimento representando 74% dos empreendedores da cidade.
PIONEIRISMO
A alagoana Tamires Melo, 32 anos, é um nome que ecoa no universo dos cabelos cacheados, não só em Alagoas, mas em todo o Brasil. Sua jornada como empreendedora começou há 12 anos, quando identificou uma lacuna no mercado: a falta de especialistas em cabelos cacheados.
Tudo começou com um blog, onde Tamires compartilhava seus conhecimentos sobre o método inglês de cuidar dos cabelos cacheados. A repercussão foi tão grande que, em apenas três anos, ela conquistou mais de 1 milhão e 500 mil seguidores, sem utilizar vídeos. "A palavra tem poder e foi através dela que mudei de carreira", afirmou.
A demanda por seus serviços cresceu exponencialmente, e ela deixou de lado o curso de licenciatura em Artes Cênicas para se dedicar integralmente ao seu negócio. "As pessoas me pediam para cortar seus cabelos a seco, mesmo sem eu ser cabeleireira. Isso mostrou o quanto era necessário esse tipo de serviço em Alagoas", conta.
Tamires foi uma das primeiras especialistas em cabelos cacheados do Brasil e se tornou referência. No entanto, o caminho não foi fácil. "A questão tributária em uma cidade pequena é um grande desafio. Queremos oferecer o melhor serviço, mas os custos são altos. Mas temos um propósito e seguimos em frente, mesmo com as dificuldades", explica.
HORA DE EXPANDIR
Atualmente, o salão de Tamires (@assessoriadoscachos) conta com uma equipe de cinco profissionais e oferece um atendimento personalizado. Além disso, ela está promovendo um curso Vip acessível em um dia, que incentiva novos afroempreendedores e o Mãos que Empoderam, onde já atendeu gratuitamente mais de 100 meninas e mulheres periféricas em parceria com a Cufa Alagoas.
A empresária já possui planos de franquear a marca e lançou, em junho deste ano, sua própria linha de cosméticos. "É um sonho realizado após anos de investimento e aprendizado", comemora.
Para aqueles que desejam empreender no mercado afro em Alagoas, Tamires tem um conselho: "Entre nesse mercado com o propósito de transformar a vida das pessoas. O sucesso só vem com muito trabalho e dedicação."
A história de Tamires Melo é um exemplo de como a paixão e a determinação podem transformar vidas e gerar impacto social. Sua trajetória inspira outras mulheres negras a empreenderem e a valorizarem seus cabelos naturais.
PERSPECTIVAS
O impacto econômico dos negócios liderados por afroempreendedores negros é visível na economia local e regional. Esses negócios não apenas contribuem para o crescimento econômico de Alagoas, mas também promovem uma distribuição mais equilibrada de oportunidades e recursos.
Para Jonathan, o afroempreendedorismo, se configura como um motor de desenvolvimento sustentável e inclusivo, destacando a força e a resiliência dos empreendedores negros diante dos desafios, enquanto abrem caminhos para gerações futuras.
"O afroempreendedorismo em Alagoas está ganhando força e representatividade, impulsionado pela demanda por um ambiente econômico mais igualitário e pela crescente conscientização da sociedade sobre a necessidade de inclusão social e econômica. Este movimento é essencial não apenas para o progresso individual desses empreendedores, mas também para o fortalecimento e o enriquecimento do tecido econômico e cultural da região", disse.
Para fortalecer o afroempreendedorismo em Alagoas, ele ainda destaca que é crucial que políticas públicas sejam estrategicamente direcionadas para atender às necessidades e potencialidades desse segmento, reconhecendo o impacto socioeconômico significativo que os afroempreendedores trazem para a economia local.
"Entre as principais ações de incentivo, o acesso ao crédito ocupa um papel central. Muitas vezes, a falta de recursos financeiros limita o crescimento e a sustentabilidade dos negócios liderados por empresários negros. Programas de microcrédito com condições acessíveis e linhas de financiamento específicas podem proporcionar a base para que eles não apenas sobrevivam, mas prosperem. Esse acesso é fundamental para que o capital necessário para expansão e inovação se torne uma realidade", pontuou.
O afroempreendedorismo é um movimento vibrante e promissor, com o potencial de transformar o estado e gerar oportunidades para milhares de pessoas. No entanto, para que esse potencial seja realizado, é preciso superar os desafios existentes e criar um ambiente mais favorável para o desenvolvimento desses negócios.
*Publicado originalmente na edição 86 da revista Painel Alagoas
Fonte: Painel Alagoas