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16/09/2024 às 06h40

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O sapo e a panela


O sapo e a panela

Reza a lenda – ecologicamente incorreta, diga-se – que se colocarmos um sapo em uma panela de água fervendo ele instintivamente pula, salvando-se assim da queimadura; entretanto se o colocássemos em uma panela com água fria e a aquecêssemos lentamente, ele acabaria morrendo cozido.

Bem, nunca fiz nem nunca farei tão cruel experiência, mas a fábula cabe como uma luva quando falamos em finanças pessoais; o sapo representando nosso orçamento, a temperatura da água a renda que temos à nossa disposição e a panela a armadilha do desequilíbrio nas próprias contas. Confuso? Então calma lá, meu querido leitor, minha querida leitora, que já me explico!

Imagine que você viva atualmente com um orçamento em torno dos R$ 3 mil mensais, com os quais pague seus compromissos do dia a dia. Para ilustrar a primeira situação, suponha agora que você inesperadamente seja promovido a quatro cargos acima do seu, passando a receber, de uma hora para outra, três vezes mais. Salvo melhor juízo, e mesmo sabendo que com uma maior renda, seu conforto irá aumentar, acredito que dificilmente você iria, de uma hora para outra, mudar padrões de comportamento tão rapidamente assim: não iria, por exemplo, mudar-se de onde mora, trocar a escola das crianças ou o carro ainda não pago. A mudança em seu patamar, por ter sido súbita, possivelmente demoraria até ser absorvida, tempo suficiente para planejar com calma o que fazer e consequentemente fugir do desequilíbrio orçamentário. Conheço algumas poucas pessoas (essa não é uma situação comum, atenção!) que viveram situações similares e que, não obstante tenham modificado seu padrão de vida para melhor, foram conscientes o suficiente para não torrarem todo o dinheiro extra, acumulando algum patrimônio após um longo período controlado. Dentre estes, alguns adquiriam imóveis, outros acumularam recursos em aplicações financeiras, e uma fração pequena, acabou partindo para montar o próprio negócio, que tal?

Agora suponha que, em um outro contexto, você receba a cada ano um aumento de R$ 600 mensais, de forma que a renda de R$ 9 mil só seja atingida daqui a 10 anos. Claro que não posso afirmar que as coisas irão se passar exatamente como descreverei a seguir, mas há grandes chances de ficarem bem próximas deste cenário. Como o aumento gradual não chegaria a levá-lo a outro patamar de renda, o mais provável é que você incorporasse os recursos extras em suas despesas: por exemplo, passar a frequentar um restaurante mais caro, mudar o guarda-roupa com maior frequência, trocar o celular pelo modelo mais moderno. Ou seja, analogamente ao sapo que não percebe a mudança de temperatura pois se acostumou à água mais morna, seu orçamento também não, e como resultado – pelo menos é o que diariamente percebo em quem me consulta – é que 10 anos depois de iniciado processo, o corre-corre atrás das contas ainda continuaria. Poucos são os que conseguem sair deste círculo vicioso, deixando passar assim, a oportunidade de uma vida financeira saudável.

As duas situações que ilustrei são, obviamente, excludentes, ou seja, ou você viverá uma evolução profissional-financeira súbita (a primeira) ou gradual (a segunda). Infelizmente, o mundo nos mostra que é mais comum o segundo caso, ainda que sonhemos com o primeiro. Não é à toa que as filas para jogos em loteria dão voltas nos quarteirões.

Voltando à realidade e considerando que é quase certo que você se situará no caso mais comum (pode até fazer a sua fezinha no jogo, mas não o tenha apenas como sua única solução), o que eu poderia sugerir para ajudá-lo a, mesmo fazendo parte do segundo grupo, usufruir dos benefícios do primeiro, após alguns anos?

Procurando não me alongar – tenho dado dicas específicas ao longo dos meus outros artigos – recomendo parcimônia em relação aos aumentos. Nem muito lá, nem muito cá, uma boa técnica seria usar o princípio do “pague-se primeiro” reservando parte da renda adicional que iria receber para a melhoria do seu dia a dia, e parte para acumular para futuros grandes projetos. Na simulação citada, você poderia guardar metade e absorver (isto é, gastar!) a outra metade. No primeiro ano após o aumento, você teria mais R$ 300 mensais para o consumo e guardaria R$300 mensais; no segundo ano, com mais R$ 600 de acréscimo no salário, você teria mais R$ 300 mensais para o consumo, guardando os outros R$ 300. Note que procedendo assim, já no décimo ano você terá dobrado seu atual patamar de consumo, podendo gastar R$ 6.000 mensais... noves-fora que terá guardado R$ 198.000 um patamar de consumo  (ao todo  para metade, por exemplo e, ter a satisfação de, após 10 anos, viver em um patamar de consumo de R$ 6.000, guardando R$ 3.000 mensais. Fazendo assim, após os 10 anos você teria dobrado seu padrão de vida e, simultaneamente, poupado R$ 198 mil... E o que é melhor, supondo uma aplicação mensal a 0,6%am, os juros teriam feito esse capital se transformar em R$ 257.929. Nada mau, não?

Um grande abraço e até a próxima!


Inteligência Financeira por Roberto Zentgraf

Graduado em Engenharia Civil (UFRJ), teve experiência profissional construída marcadamente na área financeira, iniciada na Controladoria do Grupo Exxon Foi professor no Grupo Ibmec lecionando disciplinas da área financeira (Matemática Financeira, Estatística, Finanças Corporativas, Gestão de Portfolios, dentre outras)

Paralelamente a estas atribuições, passou a assinar uma coluna semanal sobre Finanças Pessoais no jornal O Globo, tendo a oportunidade de esclarecer as principais dúvidas dos leitores sobre orçamento pessoal, dívidas, aposentadoria, financiamento imobiliário e investimentos. O sucesso atingido pela coluna proporcionou inúmeras participações em palestras, comentários na mídia escrita e televisiva, além da publicação de outros sete livros tratando o tema.

Após obter a certificação de planejador financeiro (CFP® Certified Financial Planner) associou-se à BR Advisors, grupo especializado em soluções financeiras.


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