Por Carlos Amaral
A fala do ministro Milton Ribeiro sobre as crianças com deficiência ocorreu após a publicação do Decreto 10.502, em setembro de 2020, que institui a Política Nacional de Educação Especial. Para Edna Lopes, Secretária de Assuntos Educacionais do Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Alagoas (Sinteal), as palavras do ministro foram mais graves que o decreto em si.
“O Brasil é signatário da convenção de pessoas com deficiência. E, por participar dessa convenção internacional, deveria o Ministério da Educação tratar a perspectiva da inclusão de modo diferente não com o preconceito que o ministro tem demonstrado. Nesse caso, a fala é mais grave, mais comprometedora é o próprio decreto, que aponta a possibilidade de que se retorne a essa concepção de que as pessoas com deficiências devam ser separadas das classes de inclusão da escola da escola pública. A gente está vendo o quanto é importante essa inclusão com a inclusive a Paralimpíada de Tóquio”, diz Edna Lopes.
A educadora ressalta o caráter exclusivista do Decreto 10.502.
“A gente diz que é o decreto da exclusão, pois desconsidera todo o salto qualitativo dados para essas e adolescentes chegarem à escola. Em 2020, nós tínhamos um pouco mais de 90% de estudantes com deficiência matriculados na escola comum”, pontua. “Mas isso não quer dizer que basta essa matrícula. Se o estudante com deficiência tem uma necessidade de acompanhamento psicopedagógico por conta da aprendizagem, já que nem toda deficiência é igual, nem todo nível de comprometimento é o mesmo, isso precisa ser garantido. Cada pessoa é avaliada no seu contexto, não em relação ao outro, no que ela consegue desenvolver”, completa Edna Lopes.
Ela também destaca a importância da convivência das crianças num ambiente escolar regular.
“A questão da inclusão é extremamente importante. Primeiro, pelo benefício do convívio com os diferentes. Ganha a pessoa com deficiência e ganha os que não têm uma deficiência porque aprende, com esse convívio, a saber que uma limitação não é incapacidade”, argumenta. “Ao longo dos anos a gente tem acompanhado e acumulado referências, principalmente no depoimento de pais de estudantes, de famílias, das famílias dizendo o quanto a ida, o quanto, no princípio era um temor e acabou sendo entendido como um benefício esse convívio porque toda escola precisa aprender a lidar com o preconceito de que essas crianças atrapalham, como disse o ministro”, completa Edna Lopes.
A dirigente sindical destaca a articulação de organizações em defesa a educação inclusiva no país.
“A partir da aprovação do decreto, um grupo imenso de instituições se juntaram no que a gente chama de Coalizão Brasileira para Educação Inclusiva. São mais de cinquenta organizações defendendo a inclusão escolar no país e que se reafirma que o decreto é um retrocesso imenso, mesmo o Brasil tendo se comprometido com políticas públicas voltada para a inclusão”, diz. “Mas o MEC desrespeita tudo isso e segue organizando reuniões e confundido famílias e representantes de escolas”, completa.
REDE ESTADUAL
A rede estadual de ensino de Alagoas possui três unidades especializadas em educação especial. Segundo o portal da Secretaria de Estado da Educação (Seduc).
Diz a Seduc que: A Educação Especial é a “modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação” (Redação dada pela Lei nº 12.796/2013, art.58, que alterou a LDB). Como modalidade de ensino é transversal a todas as etapas e a outras modalidades, devendo ser contemplada no projeto político-pedagógico da unidade escolar. Inserida na política de educação inclusiva, essa modalidade preceitua a valorização da diferença como elemento essencial para o fortalecimento do processo de ensino e aprendizagem significativa, considerando os estudantes conforme suas particularidades e potencialidades, ajudando-os a superar as possíveis barreiras para o seu aprendizado.
Ainda de acordo com a Seduc, as ações realizadas nesta modalidade são: formulação de políticas para atender às necessidades individuais da pessoa com deficiência em consonância com os níveis de ensino correspondentes; proposição de diretrizes para a organização e avaliação curriculares para a pessoa com deficiência; proposição de diretrizes e normas complementares sobre a organização e o funcionamento das unidades que tratam da educação especial; realização de estudos e pesquisas objetivando subsidiar a proposição de práticas pedagógicas para a pessoa com deficiência; proposição de políticas de formação continuada e específica para profissionais do magistério que trabalham com os estudantes com deficiência; articulação, com instituições públicas, privadas e organizações sociais a fim de subsidiar a formulação de políticas para a pessoa com deficiência; proposição de ações que viabilizem o acesso às pessoas com deficiência escolarizadas, maiores de 14 anos, no mercado de trabalho, em articulação com a gerência de gestão da educação profissional técnica.
As três unidades especializadas da rede estadual de ensino de Alagoas são: Centro Especializado Cyro Accioly, Centro de Educação Especial de Alagoas Professora Wandette Gomes de Castro e Centro de Capacitação dos Profissionais da Educação e de Atendimento às Pessoas com Surdez Professora Joelina Alves Cerqueira.
ADUFAL
Assim como a dirigente do Sinteal, Jailton Lira, presidente da Associação de Docentes da Ufal (Adufal), também critica a fala do ministro da Educação.
“A afirmação do ministro é totalmente contrária ao que está previsto na Constituição, na Lei Brasileira de Inclusão e nas metas do Plano Nacional de Educação [PNE], eixos legais resultantes de amplos debates com o conjunto da sociedade. Com base nesse ordenamento jurídico e em preceitos éticos e pedagógicos, entendemos que o melhor caminho para garantir a cidadania a essa parcela da população brasileira é o acesso à educação, sendo de extrema importância que isso aconteça no ensino regular, em salas de aulas comuns”, pontua. “Fica claro que o ministro da educação desconhece a realidade da educação brasileira e da complexidade dos seus problemas, do qual constatamos uma completa omissão deste órgão quanto ao suporte necessário aos entes federativos, universidades e institutos de educação, bem como a estabelecer uma coordenação mínima dos sistemas educacionais tanto antes quanto durante a pandemia do covid-19”, completa.
Jailton Lira é outro que ressalta a importância da inclusão no ambiente escolar.
“É através da educação que promovemos a inclusão praticamos o respeito à diversidade humana. A ideia de aulas separadas para crianças com deficiência, sem a convivência com outras, é um retrocesso. A educação escolar é um direito humano, para todos/as, independentemente de suas condições ou características”, afirma. “O próprio decreto no 10.502/20, que definiu a ‘nova’ Política Nacional de Educação Especial, que prevê a recriação de classes e escolas especiais às pessoas com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, altas habilidades ou superdotação é o reflexo absurdo deste tipo de visão preconceituosa do mundo”, completa o presidente da Adufal.
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Fonte: Painel Alagoas