Por Carlos Amaral
O argumento central do Governo Federal é que a reforma é necessária para sanar as contas da Previdência e resolver o problema do “rombo” ao qual é vítima. Contudo, para o advogado, especialista em Direito Previdenciário, Antonio Garyfalos, isso não é verdade.
“A reforma, como o governo coloca, é abrupta e desnecessária porque nossa seguridade social é tripartite, com assistência, saúde e previdência. A Previdência Social mantém as outras duas e só perde em arrecadação para a Petrobras. Portanto, ela não é deficitária. O problema é que seu dinheiro é desviado para outros fins”, afirma. “Veja, quantas canetas Bic são produzidas e vendidas por dia no Brasil? Nessas vendas há uma porcentagem para a Previdência. Em tudo que se vende nesse país, uma parte vai para a Previdência”, completa Antonio Garyfalos.
O especialista destaca que a Associação dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), “todos os anos, demonstra que a Previdência Social não é deficitária e sim superavitária”. “O problema é que se usa o dinheiro da Previdência para outras coisas e esse recurso nunca volta. A reforma é só para encobrir as irresponsabilidades dos governos com o uso desse dinheiro”, crava o advogado.
Em sua avaliação, o povo brasileiro só vai perceber o engodo da reforma daqui a alguns anos, na medida em que a geração atual for em busca de sua aposentadoria.
“O povo brasileiro não está notando que se está trabalhando com a emoção. Só vai perceber que se cegou daqui a 10, 15, 20 ou 30 anos, quando for buscar a aposentadoria e ver que tem de trabalhar mais para ganhar menos”, comenta Antonio Garyfalos.
Ele também critica o modelo de capitalização defendido pelo governo Jair Bolsonaro, tendo como entusiasta o ministro da Economia Paulo Guedes.
“A capitalização já existe. O que o atual ministro quer é quebrar a Previdência para que os bancos tomem conta da Previdência Social que, cansados do que recebem com a previdência privada, querem tomar a pública. Se entregarmos isso, o caos estará posto para o Brasil”, afirma. “Essa reforma tem o cunho de tentar a privatização da Previdência para os bancos particulares ou fazer com que os contribuintes individuais não contribuam mais com a previdência social”. completa Antonio Garyfalos.
ROMBO
Ainda no final de 2017, já quando o governo Michel Temer (MDB) tentava aprovar sua proposta de reforma da Previdência, uma CPI foi instaurada no Congresso Nacional para apurar a veracidade sobre o discurso de “rombo” na Previdência Social brasileira. O resultado, há anos apontados por sindicatos e associações diversas país a fora, foi negativo.
O relator da CPI da Previdência, senador Hélio José (Pros-DF), declarou que “tecnicamente, é possível afirmar com convicção que inexiste déficit da Previdência Social ou da Seguridade Social” e que “são absolutamente imprecisos, inconsistentes e alarmistas, os argumentos reunidos pelo governo federal sobre a contabilidade da Previdência Social”.
A conclusão do relator vai contra a constatação do Tribunal de Contas da União (TCU) que apontou déficit previdenciário de R$ 226,9 bilhões em 2016. Esse valor considera o rombo do INSS e do regime dos servidores da União.
Na opinião do advogado Antonio Garyfalos, os governos apresentam números irreais para desviar o foco do problema que é o mau uso dos recursos. Ainda segundo ele, se quer pôr a conta nos mais pobres, especialmente nos trabalhadores rurais.
“Dizem que os trabalhadores rurais não contribuem. Mentira!”, afirma. “Eles contribuem tanto de forma direta quanto indireta. Os que o fazem de forma direta são aqueles que trabalham em fazendas que recebem salários, com carteira assinada. Em média, 8% de seus salários são recolhidos para a Previdência. O indireto é o da agricultura familiar, que tem uma roça e vende o excedente nas feiras ou revende para repassarem, o que tem de ser declarado”, explica o especialista em Direito Previdenciário.
Sobre encobrir os números reais, Maria Lucia Fattorelli, coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida, publicou artigo no portal Monitor Mercantil, em janeiro deste ano, no qual afirma que “o rombo das contas públicas decorre dos elevadíssimos gastos financeiros sigilosos, pois sequer sabemos o nome de quem recebe os juros mais elevados do mundo sobre a opaca dívida pública que nunca foi auditada; ou quais bancos receberam quase meio trilhão de reais (de 2014 a 2017) para remunerar diariamente e ilegalmente a sua sobra de caixa; ou quem recebeu os fabulosos ganhos com contrato de swap que nem cambial é, segundo brilhante representação feita por auditor do TCU (TC-012-015-2003-0), entre outros mecanismos que geram dívida pública enquanto os recursos vazam para o setor financeiro”.
Assim como Antonio Garyfalos, Maria Lucia Fattorelli, no mesmo artigo, também citou grandes obras pagas com recursos da Previdência.
“O governo não leva em conta que as pessoas que hoje estão aposentadas efetuaram as suas contribuições no passado, as quais foram usadas para construir Brasília, Ponte Rio–Niterói, a siderúrgica CSN e muitas coisas mais! Cadê o crédito decorrente desse uso dos recursos da Previdência?”, disse a coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida.
AUDIÊNCIA
No início de agosto, a Câmara Municipal de Maceió realizou, sob iniciativa do vereador Cleber Costa (Progressistas), uma audiência pública sobre a reforma da Previdência. No debate, o advogado Pedro Accioly, defendeu a necessidade da medida. Durante sua fala, ele destacou o envelhecimento populacional como um dos fatores que elevam os custos previdenciários.
“A população está envelhecendo e isso gera mais custos para o sistema previdenciário e os recursos são limitados. As reformas são amargas, porém necessárias e não impedem que o Brasil atinja um padrão mais elevado e reformule algumas coisas. Acredito que seja um sacrifício visando um desenvolvimento futuro. Precisamos refletir sobre esse tema, despertar o gigante que ficou tão adormecido e valorizar as oportunidades que o sistema vai nos oferecer”, afirmou Pedro Accioly.
Antonio Garyfalos também participou da audiência pública da Câmara Municipal de Maceió.
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Fonte: Painel Alagoas